No Oeste os autocarros são gratuitos e fiáveis e os comboios pagam-se e atrasam-se
06/08/2025 19:00 - Público
Gratuitidade do transporte público rodoviário duplicou a emissão de passes nos concelhos da OesteCIM no primeiro semestre deste ano.
No Oeste, os autocarros são gratuitos e fiáveis, os comboios são pagos e andam atrasados ou são suprimidos. Assim se pode resumir a realidade dos transportes públicos nos concelhos da Comunidade Intermunicipal do Oeste (OesteCIM), a primeira no país a instaurar um passe gratuito para todos os seus cidadãos residentes ou que trabalham na região.
Segundo dados da própria CIM, entre Janeiro e Junho deste ano foram vendidos 94.390 passes rodoviários, contra os 43.283 do período homólogo em 2024. Um aumento de 50% que se explica pela possibilidade de as pessoas poderem apanhar qualquer tipo de autocarro, seja municipal ou entre municípios, sem pagar. Só ficam de fora os autocarros Expresso. Contudo, o número de validações só subiu de 1,1 para 1,5 milhões em igual período (mais 29%), não acompanhando, assim, o acréscimo da venda de passes.
A gratuitidade dos autocarros custa à OesteCIM 13 milhões de euros por ano. Um montante que, de acordo com aquela entidade, “engloba as compensações a atribuir aos operadores que asseguram o serviço público de transporte rodoviário na região, designadamente a Rodoviária do Oeste, Barraqueiro Oeste e Boa Viagem”, tudo empresas do grupo Barraqueiro.
Os autarcas da região querem ir mais longe e está em curso a compra de 51% do capital social da Rodoviária do Oeste, que permitirá à CIM atribuir-lhe directamente a concessão do serviço público rodoviário de passageiros sem necessidade de ter de lançar periodicamente os habituais concursos públicos.
O procedimento para essa aquisição, contudo, é longo. Decidido em Assembleia Intermunicipal em Dezembro de 2023, o processo encontra-se em apreciação na AMT (Autoridade da Mobilidade e dos Transportes). Se o parecer do regulador for positivo, o mesmo deverá ainda passar pela Autoridade da Concorrência e pelo Tribunal de Contas.
A uma oferta rodoviária fiável, ainda que heterogénea, nos 12 municípios do Oeste, contrapõe-se o serviço ferroviário que atravessa oito concelhos do Oeste e está a definhar à míngua de material circulante. Aquilo que deveria ser uma situação verdadeiramente excepcional – a supressão de comboios – tem vindo a normalizar-se como um acto de gestão corrente, mas que tem implicações, pois deixa os passageiros nas das estações sem qualquer informação à espera de comboios que não chegam. Acresce que a supressão de comboios se traduz sempre em atrasos de vários horas nos comboios que restam em circulação.
Na quarta-feira, 5 de Junho, foram suprimidos dois comboios entre Caldas da Rainha e Leiria, dois entre Caldas da Rainha e Meleças e um entre Santa Apolónia e Caldas da Rainha. Em Julho foram suprimidos, pelo menos, cinco comboios, e desde o princípio do ano já foram cerca de 30. A CP não costuma assegurar serviço de substituição rodoviário.
Com a devolução a Espanha de mais três automotoras UTD (Unidade Tripla Diesel), o cenário de escassez de material circulante tende a acentuar-se. Após a notícia do PÚBLICO de que a CP estava a estudar a supressão de comboios regionais no Douro como consequência da falta de automotoras, a empresa reagiu assegurando que tal não resultará “na supressão de qualquer comboio”. Mas qualquer tentativa de optimização da frota a diesel existente defronta-se sempre com a falta de material e consequente perda de robustez e fiabilidade da operação. Com a também acrescida dificuldade em recrutar e segurar operários nas oficinas, que não dão vazão às necessidades de manutenção e reparação de comboios, e o período de férias estival, a situação tende a piorar e as supressões tenderão a afectar as linhas do Douro, Oeste, Alentejo e Algarve.
Com os autocarros acessíveis a uma população que está a habituar-se a viajar sem pagar, a CP não tem feito qualquer esforço para negociar com a OesteCIM a partilha do bolo da gratuitidade dos transportes públicos na região. De momento, os 13 milhões de euros vão todos para a Barraqueiro. Ao PÚBLICO, o gabinete de comunicação da empresa dizia em Março passado que “a CP defende que o comboio deve, sempre que possível, ser integrado nos sistemas de mobilidade regionais e que já manifestou disponibilidade à OesteCIM para analisar a possibilidade de integrar os seus serviços no título intermodal local”. Em Julho, a CP admitia que este processo “não sofreu qualquer alteração”.
Por sua vez, a OesteCIM diz que “mantém uma linha de diálogo com a CP e demais entidades competentes, no sentido de avaliar a integração do modo ferroviário no sistema tarifário regional, designadamente nos concelhos abrangidos pela Linha do Oeste”. Um tema que se encontra “em análise” e que será concretizado “logo que estejam reunidas as condições técnicas, operacionais e institucionais necessárias”.