A portuense que dá cor aos vazios das fachadas — com um toque de poesia
13/05/2022 19:37 - NIT

A ideia surgiu durante a rotina dos tempos de faculdade. Entre a estação de comboio e a universidade, eram muitas as fachadas danificadas que lhe surgiam pela frente. “Estava sempre a dar de caras com fachadas onde faltavam azulejos. Isso inquietava-me”, conta à NiT Joana de Abreu. A inquietação revelou-se uma oportunidade. Estava prestes a … Continued O conteúdo A portuense que dá cor aos vazios das fachadas — com um toque de poesia aparece primeiro em NiT.

A portuense que dá cor aos vazios das fachadas — com um toque de poesia

A ideia surgiu durante a rotina dos tempos de faculdade. Entre a estação de comboio e a universidade, eram muitas as fachadas danificadas que lhe surgiam pela frente. “Estava sempre a dar de caras com fachadas onde faltavam azulejos. Isso inquietava-me”, conta à NiT Joana de Abreu.

A inquietação revelou-se uma oportunidade. Estava prestes a fazer a tese de mestrado em Artes e Design para o Espaço Público e necessitava de uma ideia para um projeto. Juntou um mais um e criou o Preencher Vazios, que é hoje quase um trabalho a tempo inteiro.

“Cada vez mais fachadas estão a ficar sem azulejos, mas é algo que parece que nos passa ao lado, que se tornou normal”, explica a jovem de 29 anos. Para dar uma nova cor às fachadas e alertar para este problema, imaginou uma forma de completar esse puzzle, o buraco deixado pelos azulejos que caíram, danificados com o tempo, e os outros que vão sendo roubados.

Criou, então, pequenos azulejos de madeira com 3,5 centímetros de altura e largura. Era um material barato e fácil de trabalhar, ideal para um projeto universitário, sem grandes capacidades de financiamento. Joana tenta sempre recriar o padrão dos azulejos existentes na fachada, mas dá-lhes uma cor diferente, mais forte.

“Altero sempre a cor para criar contraste entre passado e presente. Não quero que as peças se confundam com os cerâmicos originais”, nota.

Desde 2016, ano em que imaginou o Preencher Vazios, as instalações foram evoluindo. Começou também a juntar-lhes frases de autores portugueses, excertos dos quais gostava e que, percebeu rapidamente, tornavam as obras ainda mais chamativas.

Em seis anos, perdeu a conta às instalações que deixou pelas ruas de Porto e Lisboa, mas assegura que são já “mais de cem”. E, contrariamente, ao que se poderia pensar, nunca teve problemas pelo facto de colocar as suas obras em fachadas alheias.

“Sempre que percebo que alguém mora na casa, toco e dou a conhecer o meu trabalho. Costumam receber super bem a ideia. Nunca tive problemas”, conta. “Explico sempre que a instalação é efémera, não tem o objetivo de permanecer lá para sempre. O objetivo é também que os proprietários acabem por mandar fazer réplicas para reparar a fachada, que invistam na recuperação do património.”

Não foi só em Lisboa e Porto que deixou a sua marca. Também já colocou os seus azulejos em Marraquexe, Paris e Roma. “O de Marrocos não sei se ainda está lá, mas os de Paris e Roma permanecem, porque costumo receber fotos de quem passa por lá.”

Em Portugal, já não pode dizer o mesmo. Nunca se esquece do local de nenhuma das obras e, sempre que está por perto, faz uma visita. “Por vezes caem umas peças, é natural, mas há algumas que desapareceram por completo. Claro que foi alguém que as retirou, não sei se para vender ou para colocar em casa (risos).”

Joana fez, então, das fachadas as montras do seu trabalho. É através dela que lhe chegam muitos clientes, sobretudo a pedirem-lhe que faça painéis personalizados para que depois os coloquem na decoração de sua casa.

Apesar de também fazer design gráfico para casamentos e eventos, é no Preencher Vazios que empenha muito do seu tempo. “Tenho um catálogo com todos os padrões. As pessoas podem escolher dois ou três, enviam-me uma foto da parede onde o querem colocar e eu envio várias sugestões de padrões e composições para que possam ver como ficam”, explica.

Os seus azulejos coloridos saltaram para todo o tipo de produtos, de agendas a bases de copos e até máscaras. No entanto, além de lucrativo, o projeto continua a ter um objetivo nobre. “Quero continuar a chamar à atenção para este problema das nossas cidades. Por muito que as casas sejam de pessoas individuais, o património é de cada um de nós e temos que cuidar dele.”