"Trouxe a ferrovia para o centro do debate político"
19/12/2023 06:59 - Dinheiro Vivo
António Brancanes dos Reis, presidente da Associação para os Amigos dos Caminhos-de-Ferro (APAC), destaca que Pedro Nuno Santos promoveu o debate pela ferrovia enquanto elemento de maior eficácia e sustentabilidade nos transportes. Por outro lado, lamenta que o então ministro das Infraestruturas não tenha conseguido "imprimir maior dinamismo aos investimentos" para as linhas de comboio
Enquanto ministro, o que Pedro Nuno Santos fez de mais positivo e onde desiludiu na ferrovia?
Como mais positivo destacam-se três aspetos. O primeio, o facto de ter trazido, de forma consequente, a ferrovia para o centro do debate político relacionado com a mobilidade e os transportes, sempre numa perspetiva de maior eficácia e sustentabilidade. Há que não esquecer que, durante muitos anos, a ferrovia vinha sendo apenas mais um dos muitos "chavões" utilizados a eito no discurso político.
Segundo, relacionado com o Plano Ferroviário Nacional. Uma visão estratégica para a ferrovia tem necessariamente de ser perspetivada de forma global e não, como vinha sendo hábito, com a tomada de medidas avulsas.
Terceiro, ter conseguido criar as condições necessárias à resolução da dívida histórica da CP, problema que se arrastava ao longo de décadas por o Estado se eximir ao cumprimento das suas obrigações, não só enquanto acionista mas também no que respeita ao serviço público prestado por aquela empresa.
Como negativo, resulta claro o não ter conseguido imprimir maior dinamismo aos investimentos previstos para a infraestrutura ferroviária, quer na sua execução quer na garantia do seu financiamento concreto. Infelizmente, é com alguma regularidade que continuamos a ser confrontados com os sucessivos atrasos em importantes obras ferroviárias programadas ou em curso no nosso país.
Ainda faltam dois anos para começarem a chegar novos comboios e persistem os atrasos nas obras das linhas. Há opções para tornar os comboios mais atractivos para passageiros e cargas?
A atratividade do comboio como meio de transporte de pessoas e mercadoras está necessariamente dependente da sua fiabilidade, pontualidade e capacidade de resposta concorrencial face a outros meios de transporte. Portanto, se queremos tornar o transporte ferroviário mais atrativo, há que tomar medidas que impactem os potenciais utilizadores àqueles níveis. No que se reporta ao transporte de passageiros, assegurando, para além do já referido, mais conforto e melhores articulações de horários. No transporte de mercadorias, a criação de medidas concretas que tornem o transporte ferroviário mais concorrencial com o transporte rodoviário, nomeadamente ao nível das taxas de utilização da infraestrutura ferroviária.
O que falta fazer para que os comboios ganhem mais protagonismo na agenda dos partidos?
Essa é uma boa pergunta para ser colocada aos partidos políticos. Não é preciso olhar para muito longe para ver como a ferrovia tem vindo a ser reconhecida, de forma estratégica, como o meio de transporte de pessoas e as mercadorias mais eficiente e eficaz. Tem sido assim na Europa e em muitos outros países do mundo. Por exemplo, aqui bem perto de nós, já há países a tomarem medidas concretas de limitação de transportes menos eficientes nos percursos de curta e média distância, favorecendo a sua substituição pelo caminho de ferro. Tentando responder à sua pergunta, julgo que faz falta aos partidos terem uma verdadeira noção do que é a ferrovia e de qual o seu real e objetivo potencial para o nosso futuro, não só numa perspetiva de sustentabilidade e dinamismo económico, mas também como fator de coesão social e geográfica do nosso país.