Gabinete que investiga acidentes tem diretor definitivo ao fim de seis anos
29/10/2023 07:10 - Dinheiro Vivo

Desde que foi criado, em 2017, gabinete de prevenção e investigação de acidentes com comboios e aviões foi liderado por um líder em substituição. Nomeação efetiva apenas ocorreu no início deste mês

Gabinete que investiga acidentes tem diretor definitivo ao fim  de seis anos

O acidente ferroviário de Soure em julho de 2020, a queda de uma avioneta numa praia da Costa de Caparica em agosto de 2017 e as falhas no controlo de tráfego aéreo no Porto e em Ponta Delgada detetadas nos últimos dois anos têm um ponto em comum. Os acontecimentos foram escrutinados pelo Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF).O gabinete teve um diretor em substituição durante mais de seis anos. Apenas no início de outubro foi nomeado um líder efetivo, com mandato de cinco anos.

Desde 2017, o Governo tentou encontrar um nome efetivo para o lugar. O processo foi liderado pela Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP). A comissão fez várias tentativas ao longo do tempo, "não tendo sido encontrados três candidatos com o mérito exigido para o cargo", refere o despacho publicado esta semana em Diário da República.

Perante o impasse, a última palavra coube a João Galamba. "Designo o engenheiro Nélson Rodrigues de Oliveira para exercer, em regime de comissão de serviço, por um período de cinco anos, o cargo de diretor do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários, conforme resulta do seu currículo académico e profissional que evidencia a competência técnica, aptidão, experiência profissional e formação adequadas ao exercício das respetivas funções.

O GPIAAF nasceu em abril de 2017. Resultou da fusão entre o Gabinete de Investigação de Segurança e de Acidentes Ferroviários (GISAF) com o Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves (nascido em 1999)."Em países europeus, como a Áustria, a Bulgária, a Croácia, o Luxemburgo, a Noruega e a Suécia, os organismos responsáveis pela prevenção e investigação de incidentes e acidentes, têm atribuições concentradas na área da aeronáutica e na área ferroviária, contribuindo, assim, para uma visão integrada na área da investigação de incidentes e acidentes nestes modos de transportes, potenciando o aproveitamento de sinergias e a partilha de competências", justificou o então Ministério do Planeamento e das Infraestruturas.

Desde a fundação, o GPIAAF foi liderado por Nélson Rodrigues de Oliveira em regime de substituição, após presidir, por três anos e meio, ao antigo gabinete de investigação de acidentes nas linhas de comboio. Chegou ao lugar depois do processo de seriação da CReSAP. Antes da fusão, o GISAF esteve praticamente três anos sem funcionar: o lugar de diretor ficou vago entre janeiro de 2011 e outubro de 2013, após a saída de Vítor Manuel de Sousa Risota.

Investigar sem punir

A investigação de acidentes nos caminhos-de-ferro em Portugal data de meados do século XIX. Durante mais de 100 anos, sempre que ocorriam desastres, eram nomeadas comissões independentes para apuramento de causas e de responsabilidades. "Esta prática manteve-se praticamente inalterada, sendo a investigação oficial dos acidentes conduzida por técnicos do organismo Estatal ao qual, em cada época, incumbia a fiscalização dos caminhos-de-ferro", lê-se na página do GPIAAF. Até abril de 1975, a CP era uma empresa privada, pondo os comboios nos carris através de contratos de concessão assinados pelo Estado.

Após a nacionalização da CP, as investigações aos acidentes deixaram de ser autónomas porque passaram a ser "realizadas por comissões de inquérito constituídas essencialmente por elementos da transportadora ferroviária nacional, eventualmente com a participação de representante do Ministério da Tutela nos casos de maior gravidade".

A peritagem apenas voltou a ser autónoma em 1998, ano em que as investigações passaram para um novo regulador, o Instituto Nacional do Transporte Ferroviário. O instituto foi extinto em 2007 e, no ano seguinte, nasceu o GISAF, após transposição de uma nova diretiva comunitária. Cada país da União Europa teve de criar um organismo "independente na sua organização, estrutura jurídica e processo de decisão, da autoridade nacional de segurança ferroviária, da entidade reguladora dos caminhos-de-ferro, de qualquer gestor de infraestrutura, empresa ferroviária, organismo de tarifação, entidade responsável pela repartição da capacidade e organismo notificado, e de qualquer outra parte cujos interesses possam colidir com as tarefas que lhe são confiadas".

Atualmente, o papel do GPIAAF é "exclusivamente técnico" e "não tem qualquer função ou objetivo de determinação de culpas ou responsabilidades nos acidentes ou incidentes". Após a investigação de acidentes ou de incidentes que ponham em causa a segurança do transporte ferroviário, é elaborado um relatório com recomendações que "visem reduzir a probabilidade da sua ocorrência ou a gravidade das suas consequências". Além dos comboios de passageiros e de mercadorias, a atuação do gabinete de investigação incide sobre os metropolitanos de Lisboa, Porto e Sul do Tejo, os funiculares dos Guindais e de Viana do Castelo, além dos ascensores do Bom Jesus (de Braga) e da Nazaré e ainda do Elétrico de Sintra.