PPP podem estar de volta para pagar a Alta Velocidade
29/09/2022 06:30 - Público

Governo vai estudar diferentes modelos de contratação das obras para encurtar os tempos de viagem entre Lisboa e o Porto. Em cima da mesa está o modelo de parceria público-privada.

PPP podem estar de volta para pagar a Alta Velocidade

Já se sabia que a Alta Velocidade apostaria na corda litoral do país e que tentaria “agarrar” a Galiza e já se sabia que as contas apontam para um investimento de 4500 milhões de euros. O que nunca se tinha explicado é como se paga tal ambição – e essa é a grande novidade da apresentação desta quarta-feira do programa de Alta Velocidade (AV). De entre as propostas da Infra-estruturas de Portugal (IP) ressalta a hipótese do modelo de parceria público-privada (PPP).

As PPP, como são abreviadamente chamadas, são um tema tabu em Portugal, que as aplicou na rodovia e na saúde, mas que teve de acabar com parte delas por exigência da troika. Se no futuro próximo houver PPP para a AV ferroviária, estas “nada têm que ver com as PPP rodoviárias do passado”, garante o vice-presidente da IP.

“Não estaremos a entregar aos privados nada que não estejamos já hoje a entregar na rede actual. Os três modelos de contratação têm vantagens e desvantagens e, no caso dessa opção, o modelo é diferente do das PPP rodoviárias, porque não contempla a exploração da infra-estrutura. Quem opera e explora somos nós [IP]”, argumenta Carlos Fernandes, em declarações ao PÚBLICO.

Não há decisões tomadas e tudo aquilo que foi apresentado em termos de financiamento são apenas propostas ao Governo, insiste. “Está tudo em aberto. Tem de haver uma decisão política.” O Ministério das Infra-estruturas responde, por seu lado, que “a decisão final não está tomada”. A IP diz que nas próximas semanas será constituída uma equipa de projecto, com a participação do Ministério das Finanças, a quem caberá avaliar se o modelo de PPP é viável e adequado ou se há alternativas melhores.

O que é claro é que um dos modelos de contratação propostos, a que a IP chama “concessão”, inclui a entrega da concepção do projecto, da obra, do financiamento e da manutenção a privados. O financiamento privado pode ser compensado por duas vias: a cobrança de uma taxa por comboio em circulação (como uma portagem numa rodovia), com essa receita a ficar para o privado; mas como Fernandes garante que a exploração das linhas de AV fica na esfera pública, poderá ser a IP a cobrar essa “portagem” ao operador de transporte, pagando depois ao privado uma “renda” periódica que assegure a manutenção das linhas para um determinado nível de serviço.

Em resumo, a IP propôs ao Governo três modelos de contratação para partes diferentes do projecto. Para as linhas de AV que têm de ser construídas, haveria um contrato de “concessão” para os dois troços da fase 1 (Porto-Oiã e Oiã-Soure), com um custo total de 2950 milhões de euros, no período 2024-2028; e outro para a segunda fase, tendo em vista o troço Soure-Carregado, a construir entre 2026 e 2030, por 1500 milhões de euros.

Como mil milhões de euros vêm do programa comunitário Connecting Europe Facility, Portugal terá de entrar com 1950 milhões na fase 1.

“O grande custo destes projectos são essencialmente os túneis e viadutos e, quando chegamos a zonas urbanas, isso pesa”, começa por descrever. Essa é uma das razões por que a terceira fase da AV entre o Carregado e Lisboa, que é “caríssima”, fica para depois de 2030. Aliás, a construção deste troço só vai poupar quatro minutos à ligação directa Lisboa-Porto, permitindo reduzir a viagem de 1h19 para os almejados 1h15 (sem paragens). Outra razão é a quadruplicação da Linha do Norte entre o Oriente e o Carregado, melhoramento que pode ser usado para a AV.

Mas o recurso ao modelo PPP – ou de “concessão”, como a IP prefere dizer – justifica-se por outras razões além do financiamento. “Temos à nossa frente um imenso programa de investimentos, nas linhas do Douro, do Oeste, do Alentejo, além de outros projectos, e os recursos não são infinitos. Arranjar um modelo [de contratação] que permita concretizar tudo ao mesmo tempo é tão importante como a questão financeira”, continua Fernandes.

A entrega a privados também pode ter vantagens de calendário. “Uma linha nova como esta tem centenas de quilómetros de expropriações. Se a fizermos no modelo tradicional, temos de expropriar segundo outras regras, é uma loucura. O privado consegue arranjar recursos que nós não temos. Há vantagens no modelo de concessão que não são apenas financeiros.”

Para os projectos complementares, como a ampliação do número de linhas na estação do Oriente e a intervenção Alverca-Azambuja, a IP propôs o modelo de empreitadas autónomas. Já para a sinalização e telecomunicações, é proposto o modelo de empreitadas de concepção, construção e manutenção.